Uma coisa que sempre me surpreende é o quanto o desconhecimento pode prejudicar as relações trabalhistas.

Recentemente nos deparamos com uma situação, onde uma empregada havia sido demitida gestante, em momento em que ela não tinha conhecimento da gravidez.

Buscou se realocar no mercado de trabalho, foi contratada em nova oportunidade, algumas semanas depois, tomou conhecimento da gravidez.

Sua atual empregadora em choque, comunicou que a empregada deveria imediatamente buscar seu empregador anterior, uma vez que não poderia ter contratado ela “daquele jeito”. E seu antigo empregador não a readmitiu ao argumento de que já havia constituído novo emprego e por conta disso nada teriam a fazer por ela.

Desse modo, a empregada, gestante, não teve resguardado naquele momento seu direito a estabilidade, tendo sido demitida pelo atual empregador, e não tendo sido readmitida pelo anterior. Muitas dúvidas existem acerca de quem seria responsável por resguardar essa estabilidade, meu entendimento é que ambas possuem responsabilidade, explico:

O desconhecimento da gravidez no ato da dispensa é irrelevante, para que empregador tenha que assumir a responsabilidade pela estabilidade da gestante, portanto, no momento em que a autora comunicou sua gravidez, deveria ter sido reintegrada.

Por outro lado, nada tem de errado em se contratar uma empregada gestante, portanto, também não haveria qualquer impedimento para que essa empregada permanecesse no vinculo atual.

Desse modo, caberia a ela escolher onde preferiria continuar com seu contrato de trabalho. Ocorre que, a primeira empresa se valeu do fato de que ao tomar conhecimento da gravidez a empregada já estava em outro emprego, razão pela qual aduziu que a segunda empresa seria a única responsável pela estabilidade.

O artigo 391-A da CLT é claro ao afirmar que a estabilidade provisória se inicia da confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho. Assim sendo, ainda que a reclamante tivesse descoberto após o encerramento do seu vínculo com a primeira empresa, esta ao descobrir da sua condição, a deveria ter reintegrado. Já a segunda empresa, não poderia tê-la demitido ao tomar conhecimento de que a mesma estava gestante.

Portanto, ambas incorreram com dolo ao demitir e ao deixar de reintegrar.

A empregada gestante possui garantia de emprego desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto, não podendo ser demitida arbitrariamente ou sem justa causa, conforme dispõe o ADCT no artigo 10, II, alínea “b’’ da Constituição Federal. De igual modo, a Consolidação das Leis Trabalhista assegura a estabilidade da empregada gestante, conforme segue:

Art. 391-A.  A confirmação do estado de gravidez advindo no curso do contrato de trabalho, ainda que durante o prazo do aviso prévio trabalhado ou indenizado, garante à empregada gestante a estabilidade provisória prevista na alínea b do inciso II do art. 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. (Grifo nosso).

 

Na oportunidade, salienta-se que a empregada gestante contratada por contrato de experiência também possui direito a referida estabilidade. De acordo com a Súmula nº 244, III do TST:

GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (redação do item III alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I – O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, “b” do ADCT).

II – A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

III – A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado. (Grifo nosso)

A estabilidade provisória à obreira grávida é um instituto criado para proteger a gestação em todos os seus sentidos, especialmente nos casos de dispensa arbitrária como ocorreu no caso em apreço, com fulcro no artigo 7º, inciso I da nossa Carta Magna. Para tanto, colaciona-se:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; (Grifo nosso)

A Súmula nº 244, I e II do TST assevera que o desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade e que a garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade.

Cabe trazer à baila o entendimento jurisprudencial dominante, o qual reconhece o direito à reintegração da empregada gestante. Vejamos:

GARANTIA PROVISÓRIA DE EMPREGO. GESTANTE. SALÁRIOS VENCIDOS. REINTEGRAÇÃO. A estabilidade da gestante possui previsão constitucional, tendo como finalidade principal a proteção da maternidade e do nascituro, sendo necessário somente que a empregada esteja grávida quanto da ruptura contratual para sua ocorrência, de modo que o desconhecimento da gravidez pelo empregador, ou mesmo pela própria gestante, quando da rescisão contratual, não é óbice ao reconhecimento da garantia de emprego. Hipótese em que a reclamante encontrava-se grávida à época da dispensa, acarretando a nulidade da extinção contratual praticada, devendo a trabalhadora ser reintegrada ao emprego, com direito ao pagamento dos salários vencidos entre a dispensa e a reintegração. (TRT-4- RO: 00200358220185040205, Data de Julgamento: 11/07/2019, 4ª Turma) (Grifo nosso)

MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO. EMPREGADA GESTANTE. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. Não há ilegalidade ou abusividade na decisão de tutela de urgência de natureza antecipatória que determina a reintegração da empregada litisconsorte. Os documentos juntados apontam que a litisconsorte estava grávida quando do encerramento do contrato de trabalho. Assim, em análise perfunctória, faz jus a litisconsorte à garantia de emprego prevista no artigo 10, II, b, do ADC. A modalidade de contrato de trabalho utilizada no caso concreto, contrato por prazo determinado, não é óbice à estabilidade da gestante, conforme entendimento vertido no item III da Súmula nº 244 do TST. Segurança denegada. 9TRT-4- MSCIV: 00210138720215040000, Data de Julgamento: 02/08/2021, 1ª Seção de Dissídios Individuais) (Grifo nosso)

Um ponto que merece destaque é o fato de o desejo de se desvencilhar da reintegração ocorreu na vigência da Lei nº 14.151/2021 que dispôs que a empregada gestante deveria permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração. Fato este que corroborou para que ambos os empregadores vissem a empregada como um fardo e buscaram se livrar da responsabilidade.

Em casos como este, é necessário recorrer ao judiciário para que a reintegração ocorra por determinação judicial.